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ARTIGO & OPINIÃO - Afinal, ordem ilegal deve ser cumprida ou não?

  A indagação é de suma importância visto que dependendo do posicionamento adotado diversas consequências podem ser imputadas ao militar. Vi...

 A indagação é de suma importância visto que dependendo do posicionamento adotado diversas consequências podem ser imputadas ao militar.

Vigora no ordenamento jurídico a determinação de que ordem manifestamente ilegal não se cumpre, inclusive tal situação configura causa excludente de culpabilidade, qual seja, inexigibilidade de conduta diversa, conforme preconiza o artigo 22 do Código Penal que tem como rubrica legal “Coação irresistível e obediência hierárquica”, in litteris“Se o fato é cometido sob coação moral irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.”

 

 

Pela transcrição do artigo acima concluímos com facilidade que a ordem manifestamente ilegal não se cumpre no que se refere ao servidor civil. O cerne da questão é: e quando o servidor for militar? A excludente de culpabilidade é extensível a ele? Poderia um militar se recusar a cumprir uma ordem manifestamente ilegal emanada pelo seu superior hierárquico, a despeito da previsão legal do crime de recusa de obediência tipificado no artigo 163 do Código Penal Militar[1]?

 

 

No intuito de responder a todas estas questões, surgiram na doutrina 02 (duas) teorias que visam elucidar o tema: TEORIA DA OBEDIÊNCIA OU BAIONETA CEGA e TEORIA DA BAIONETA INTELIGENTE.

Antes de esclarecer o teor da cada uma destas teorias é importante mencionar que nem a doutrina, nem os diplomas legais adotaram pacificamente uma ou outra. Por exemplo, no Código Penal Militar existe a previsão disposta no artigo 38, alínea b, § 2º[2] que se inclina pela adoção da Teoria da Baioneta Cega, no entanto no próprio diploma legal encontramos o disposto no artigo 41[3], que disciplina questões relativas à atenuação da pena que nos indica uma inclinação pela Teoria da Baioneta Inteligente.

 

 

Por seu turno, o Regulamento Disciplinar da Policia Militar[4] claramente adotou em diversas passagens os postulados da Teoria da Baioneta Inteligente, ex vi disposições previstas nos artigos 8º, inciso VIII[5]; 9º, § 1º, item 2[6] e 10[7].

Vejamos o que dispõe cada teoria:

<![if !supportLists]>1.)           <![endif]>TEORIA DA BAIONETA CEGA: Também conhecida como teoria da obediência cega.

 

Para os adeptos desta teoria, os militares têm a obrigação de cumprir todas as ordens emanadas pelos seus superiores hierárquicos, sob pena de incorrerem no crime de recusa de obediência previsto no artigo 163 do Codex Penal Militar. A única ordem que não deve ser cumprida é a ordem manifestamente criminosa. A ordem ilegal se cumpre e o fundamento desta posição está justamente no fato de que apesar da ordem manifestamente ilegal não ser cumprida por servidores civis, os servidores militares formam uma categoria de servidor à parte, especial e como tal lhe é dispensado tratamento diferenciado.

 

 

A hierarquia e a disciplina[8] são os valores básicos da estrutura militar[9] e, se fosse autorizado que o militar não cumprisse uma ordem ilegal estaria incorrendo em um sério risco de ser ver a própria estrutura militar ruir.

 

 

Adotando claramente esta teoria, encontramos um interessante julgado da lavra do ilustre Juiz de Direito Dr. Ronaldo João Roth, proferido em julgamento realizado do Conselho Permanente de Justiça da 1ª Auditoria da Justiça Militar do Estado de São Paulo, com sentença datada de 02.05.2006, da 34.945/03, conforme segue:

“(...) quando o subordinado recebe ordem de seu superior hierárquico, deve cumpri-la por consequente dever funcional, em ambas as situações, seja no âmbito civil, seja no âmbito militar (...) Essas situações dizem respeito à ordem não manifestamente ilegal, no caso do servidor público civil e à ordem não manifestamente criminosa, no caso do militar.”[10]

A doutrina especializada sinaliza: “Há uma séria distinção entre o art. 38, b, do CPM, e o art. 22 do CP comum: enquanto a obediência hierárquica do diploma comum a ilegalidade pode dizer respeito a qualquer dos cinco requisitos de validade do ato administrativo (competência, forma, objeto, motivo e finalidade), na do diploma castrense a ordem pode até ser ilegal (quanto à forma, à competência, ao motivo e à finalidade) e, desde que não seja conteudisticamente criminosa (ilegal quanto ao objeto), o subordinado militar tem a cumprir, sob pena inclusive de responder por crime de recusa de obediência.”[11]

 

Os Tribunais Militares também trilham do mesmo entendimento:

STM: “APELAÇÃO. DEFESA. ART. 163 DO CPM. RECUSA DE OBEDIÊNCIA. APELO IMPROVIDO. 1. Militar que se recusa a obedecer ordem de transportar paciente para a realização de exames, proferida por superior hierárquico comete o crime de recusa de obediência, sendo a posterior alegação de falta de capacitação profissional, quando o verdadeiro motivo consistia em não estar na escala de sobreaviso, não ilide a tipicidade da conduta. 2. Ainda que a reusa à ordem do superior fosse por julgá-la ilegal, o dever de obediência hierárquica atinente aos militares não lhe eximiria do cumprimento de tal determinação, já que era do conhecimento dos outros militares ali presentes a ordem recebida e, portanto, ao superior caberia eventual responsabilização pelo referido transporte. 3. A obediência hierárquica no âmbito militar possui peculiaridades, como se verifica na lição de Jorge Alberto Romeiro “o militar só pode e deve desobedecer a ordem direta do superior hierárquico em matéria de serviço, sem incorrer no crime de insubordinação, se ela tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso” (Curso de direito penal militar: parte geral. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 124). O transporte de um paciente para efetuar um exame não pode ser considerado um ato manifestamente criminoso. 4. Apelo improvido. Decisão uniforme.”[12]

...

TJM/SP: “(...) Ordem que não se reveste de manifesta ilegalidade deve ser cumprida. Os preceitos de hierarquia e disciplina não permitem o descumprimento da ordem segundo a avaliação subjetiva do subordinado.”[13]

...

TJM/SP: “ (...) Prática do crime suficientemente comprovada – Ordem que não se revestia de manifesta ilegalidade – Eventual inconformismo diante da ordem recebida não manifestamente ilegal poderia ser apresentada de forma regulamentar mediante o disposto no art. 30 do RDPM – Preceitos de hierarquia e disciplina que não permitiam no caso o simples descumprimento da ordem recebida – Crime contra a autoridade e a disciplina militar – Recurso que não comporta provimento.”[14]

 

2.) TEORIA DA BAIONETA INTELIGENTE: esta teoria, que é diametralmente oposta a anterior, defende que ordem manifestamente ilegal não deve ser cumprida, nem mesmo pelo militares, sob pena de absoluta incoerência nas ordens emanadas pelos superiores hierárquicos. Esta teoria não admite esta espécie de cumprimento de forma alguma sob o argumento de que os militares não são cumpridores cegos das ordens. Se, eventualmente entenderem que a ordem é manifestamente ilegal, deve recusar seu cumprimento utilizando-se das vias adequadas para tanto. O instrumento pertinente está previsto no artigo 30 do RDPM, in verbis:

“Representação é toda a comunicação que se referir a ato praticado ou aprovado por superior hierárquico ou funcional, que se repute irregular, ofensivo, injusto ou ilegal.

§ 1º - A representação será dirigida à autoridade funcional imediatamente superior àquela contra a qual é atribuída a prática do ato irregular, ofensivo, injusto ou ilegal.

...”.

O fundamento para o não cumprimento está disposto no artigo 41 do Código Penal Militar e, não pode o militar ser responsabilizado criminalmente pelo delito de recusa de obediência.

Conforme mencionado no início, não existe um entendimento uníssono acerca da adoção de uma teoria específica, sendo que a que predomina na doutrina e jurisprudência é a Teoria da Baioneta Cega.


[1] Art. 163. Recusar obedecer a ordem do superior sobre assunto ou matéria de serviço, ou relativamente a dever imposto em lei, regulamento ou instrução. Pena – detenção, de um a dois anos, se o fato não constitui crime mais grave.”

[2] Art. 38. Não é culpável quem comete o crime:

(...)

b) em estrita obediência a ordem direta de superior hierárquico, ma matéria de serviços

(...)

§ 2º. Se a ordem do superior tem por objeto a prática de ato manifestamente criminoso, ou há excesso nos atos ou na forma da execução, é punível também o inferior.

[3] Artigo 41. Nos casos do art. 38, letras a e b, se era possível resistir à coação, ou se a ordem não era manifestamente ilegal; ou no caso do art. 39, se era razoavelmente exigível o sacrifício do direito ameaçado, o juiz, tendo em vista as condições pessoais do réu, pode atenuar a pena.

[4] Lei Complementar n.º 893/01

[5] Art. 8º. Os deveres éticos, emanados dos valores policiais-militares e que conduzem a atividade profissional sob o signo da retidão moral, são os seguintes:

(...)

VIII – cumprir e fazer cumprir, dentro de suas atribuições legalmente definidas, a Constituição, as leis e as ordens legais das autoridades competentes, exercendo suas atividades com responsabilidade, incutindo-as em seus subordinados. DESTAQUES NOSSOS

[6] Art. 9º. A disciplina policial-militar é o exato cumprimento dos deveres, traduzindo-se na rigorosa observância e acatamento integral das leis.

(...)

§ 1º - São manifestações essenciais da disciplina:

(...)

2 – a obediência às ordens legais dos superiores. DESTAQUES NOSSOS

[7] Art. 10 – As ordens legais devem ser prontamente executadas, cabendo inteira responsabilidade à autoridade que as determinar. DESTAQUES NOSSOS

[8] Artigo 42 da CF/88“Os membros das Policiais Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.”

[9] Artigo 142 da CF/88“As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.”

[10] Destaques oriundos da transcrição

[11] MARREIROS, Adriano Alves; ROCHA, Guilherme; FREITAS, Ricardo. Direito Penal Militar. Teoria Crítica & Prática. São Paulo: Método, 2015, p. 629

[12] STM. Apelação n.º 0000011-42.2007.7.05.0005/PR, Rel. Ministro José Coelho Ferreira, j.24.06.2009 – DESTAQUES ORIUNDOS DA TRANSCRIÇÃO

[13] TJM/SP – 1ª Câm. – Apelação Criminal n.º 7.166/16 – Rel. Juiz Cel. Fernando Pereira – J. 5.04.16

[14] TJM/SP - 1ª Câm. – Apelação Criminal n.º 6.544/12 – Rel. Juiz Cel. Fernando Pereira – J. 18.03.13

Fernanda Gonçalves

Advogada / Professora / Escritora

Advogada especialista em Direito Processual Civil. Atuação na esfera Administrativo Disciplinar (Policia Civil, Militar e Forças Armadas), Criminal e Militar. Membro efetivo da Comissão permanente da Mulher Advogada da OAB/SP central. Ex-Membro da Comissão do Conselho de Segurança da OAB/SP - 125ª subseção Santana. Responsável pelo Departamento Jurídico da Associação dos Delegados de Polícia nas ações disciplinares e crimes funcionais durantes os anos de 2010/2013. Professora do Persona Cursos que oferece site dedicado ao concurso CSTAPM - Policia Militar (www.personacursos.com.br/pm). E-mail: fernanda.dra@adv.oabsp.org.br Instagram: fernanda_dra Youtube: www.youtube.com/channel/UCB7nnclr-pp1ZCsRfYs8e7A?view_as=subscriber Site: simplificandoodireitomilitar.weebly.com

FONTE:

Dra. Fernanda Gonçalves – OAB/SP 231.759

e-Mail: fernanda.dra@adv.oabsp.org.br / Instagram: @fernanda_dra

EDIÇÃO:

REDAÇÃO DO GRUPO

 

 

 

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